Semana passada participei do I Encontro Nacional de Conselhos de Medicina de 2013 realizado em Belém. Conselheiros Federais de Medicina e representantes dos 27 Conselhos Regionais estiveram em Belém debatendo temas importantes para a medicina e sociedade brasileiras.
Um dos destaques da programação foi a mesa-redonda “Aborto e desigualdade social”. Coordenada pelo presidente do CFM, Roberto d’Avila, contou com a participação da professora Débora Diniz, da Universidade de Brasília (UnB). Além dela, contribuíram o professor Christian de Paul de Barchifontaine, reitor do Centro Universitário São Camilo; o promotor de Justiça Diaulas da Costa Ribeiro e o secretário-geral do CFM, Henrique Batista e Silva, coordenador do grupo técnico criado para avaliar o tema.
Após os intensos debates os Conselheiros votaram a posição do movimento conselhal sobre um artigo específico do Projeto de Lei do Senado PL nº 236/2012 (Reforma do Código Penal) que altera, dentre uma série de outros artigos, o de número 128 do Código Penal vigente (DECRETO-LEI N.º 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940). A proposta de mudança é a seguinte:
“Art. 128. Não há crime de aborto:
I – se houver risco à vida ou à saúde da gestante;
II – se a gravidez resulta de violação da dignidade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de reprodução assistida;
III – se comprovada a anencefalia ou quando o feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida extrauterina, em ambos os casos atestado por dois médicos; ou
IV – se por vontade da gestante, até a décima segunda semana da gestação.”
Já havia consenso sobre os três primeiros incisos. O quarto, que vinha sendo discutido em sucessivos eventos, foi finalmente aprovado com cerca de 80% dos votos de Conselheiros Federais e Presidentes de Conselhos Regionais de Medicina. Significa que o Sistema de Conselhos de Medicina aprovam a descriminalização da interrupção da gravidez e respeitam a vontade da mãe. Entendem que esta medida abrirá caminho para a ampliação da realização do procedimento de forma segura diminuindo a alarmante taxa de mortalidade materna. Conheça a tramitação do projeto que está no SENADO. Leia o Ofício circular CFM 46-2013 onde o Conselho Federal de Medicina fundamenta as razões do posicionamento.
De NegriO segundo dia do I Encontro Nacional de Conselhos de Medicina 2013 foi marcado por um assunto polêmico: a situação da urgência-emergência no País. O conselheiro Mauro Luiz de Britto Ribeiro, coordenador da Comissão Técnica de Urgência Emergência do CFM, iniciou a exposição sobre o assunto fazendo relato sobre a atuação do grupo e dos debates e fóruns realizados no Brasil acerca do tema da urgência – emergência como especialidade médica. Nesta mesa também participou o Dr. Armando Negri Filho, coordenador geral da Rede Brasileira de Cooperação de Emergência. Ele apresentou bases conceituais e metodológicas da proposta de Resolução do CFM sobre os serviços hospitalares de urgências/PS. Ao final dos debates ficou bem amadurecida a necessidade do aprofundamento da discussão sobre a definição da Emergência como especialidade médica.
Na sexta feira, 08 de março, o evento debateu um tema muito caro aos Conselhos de Medicina “Diretor Técnico X Diretor Clínico”. Após um bom debate ficou claro que Diretor Técnico é o responsável pelo serviço médico em todos os seus aspectos. Este diretor, previsto em lei de 1932, responde perante os Conselhos de Medicina e é responsável pelas condições de trabalho e assistência médica prestada em sua unidade de serviço. O chamado Diretor Clínico é o representante dos médicos e esta denominação é que gerou muita confusão. Não é um cargo na estrutura interna do serviço. Deve ser eleito pelos médicos e representa estes frente à direção do serviço. Ficou claro a necessidade de atualizar a Resolução de 1991 que estipula as prerrogativas dos dois cargos.
Ao final do encontro foi aprovado, por aclamação, o “Manifesto de Belém“. O documento sai em defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) “público, integral, gratuito, de qualidade e acessível a toda a população”. Na mensagem dos médicos direcionada à Nação, os representantes do Conselho Federal de Medicina (CFM) e dos 27 Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) apontam ações anunciadas pelo Governo Federal que, em sua avaliação, se implementadas podem comprometer o futuro do sistema de saúde brasileiro.
Dr. José Antonio Ribeiro Filho Conselheiro do CFM pelo DF, Dr. José Manuel Silva Bastonário da Ordem dos Médicos de Portugal e eu
Dr. José Antonio Ribeiro Filho Conselheiro do CFM pelo DF, Dr. José Manuel Silva Bastonário da Ordem dos Médicos de Portugal e eu
Entre as preocupações dos Conselhos de Medicina estão a possibilidade de entrada de médicos estrangeiros e de brasileiros com diplomas obtidos no exterior sem sua respectiva revalidação para atender em território nacional. As entidades consideram que essa medida fere normativas legais e põe a qualidade da assistência em situação de risco, por não permitir a aferição da competência e da capacidade desses profissionais.
As entidades também criticaram a ausência de uma carreira de Estado para o médico, considerada a saída viável para a cobertura efetiva dos vazios assistenciais nos municípios mais distantes ou nas periferias dos grandes centros. Esta proposta, que já foi apresentada formalmente ao Ministério da Saúde, prevê que ao se criar essa carreira o Governo oferecerá ao médico uma política funcional (educação continuada, progressão funcional, remuneração adequada) e, principalmente, infraestrutura de trabalho (instalações, leitos, equipamentos, insumos, acesso à rede qualificada para encaminhar pacientes, etc).
Finalmente, os Conselhos de Medicina criticaram fortemente a possibilidade de estreitamento nas relações entre o Governo e as operadoras de planos de saúde. A intenção de reduzir impostos, dar subsídios e destinar recursos públicos para as operadoras de planos de saúde, conforme anunciado após encontros de representantes do Governo com empresários do setor, demonstra, de forma contraditória, o favorecimento da esfera privada em detrimento da pública na prestação da assistência à saúde, cuja prática tem sido feita sob o signo do subfinanciamento público federal, principal responsável pelas dificuldades do SUS.